De quem é realmente a culpa da crise climática?

Frank Barroso
9 Min Read
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A crise climática é, sem dúvida, um dos maiores desafios enfrentados pela humanidade no século XXI. Em meio a discussões sobre as ações que podem mitigar os impactos ambientais e reverter os danos já causados, surge a questão: de quem é realmente a culpa pela crise climática? Muitos de nós buscamos alternativas sustentáveis, como o uso de ecobags, garrafas reutilizáveis ou carros elétricos, mas essas atitudes são suficientes? Ou estamos diante de uma estratégia de distração que oculta o verdadeiro problema?

A promessa de prosperidade do crescimento econômico, que surgiu com a modernização e a Revolução Industrial, revela-se, ironicamente, uma das principais causas da crise ambiental que enfrentamos hoje. Ao longo do período conhecido como Antropoceno, a ação humana alterou de maneira irreversível o planeta, ameaçando a sobrevivência de nossa civilização. A era moderna, marcada pelo avanço da tecnologia e do capitalismo, trouxe benefícios materiais, mas também desencadeou uma devastação ambiental sem precedentes.

O Mito das pequenas ações individuais

A primeira armadilha que enfrentamos é acreditar que pequenas ações individuais são suficientes para reverter o aquecimento global. Comprar uma ecobag, reduzir o uso de plástico ou trocar o carro a gasolina por um elétrico são gestos que, embora bem-intencionados, não endereçam as causas estruturais da crise. O perigo maior reside no fato de que essas ações simbólicas podem nos levar a crer que estamos “fazendo a nossa parte”, enquanto os sistemas que causam a degradação ambiental permanecem intocados.

Esse fenômeno é amplamente explorado pelo conceito de *greenwashing*, ou “lavagem verde”, em que corporações e governos promovem práticas supostamente ecológicas para desviar a atenção do público das medidas mais ousadas e necessárias. Em vez de pressionarmos por mudanças sistêmicas e políticas mais rigorosas de controle ambiental, somos induzidos a adotar um comportamento de consumo consciente que, por si só, não será capaz de evitar o colapso climático.

Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS): um álibi insuficiente

Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), estabelecidos pela ONU, são frequentemente apresentados como um caminho viável para enfrentar a crise climática. Contudo, embora os ODS contenham metas importantes, como o combate à pobreza e a promoção de energia limpa, sua implementação muitas vezes serve mais como um álibi do que uma solução real. Grandes corporações e governos os promovem como símbolos de responsabilidade ambiental, mas muitos desses esforços são incapazes de mitigar os efeitos mais graves das mudanças climáticas.

A crítica de Karl Marx à religião como o “ópio do povo” pode ser aplicada aqui: os ODS, no contexto atual, funcionam como uma distração, oferecendo um falso senso de segurança. Ao apresentar objetivos amplos e ambiciosos, as elites globais aliviam a pressão para que mudanças estruturais profundas sejam feitas, enquanto continuam operando dentro das mesmas estruturas capitalistas que geraram a crise.

O antropoceno: o legado da ação humana

O conceito de Antropoceno, introduzido pelo químico Paul Crutzen, destaca o impacto colossal da atividade humana no planeta. Desde o início da Revolução Industrial, o ser humano passou a queimar grandes quantidades de combustíveis fósseis, elevando drasticamente a concentração de dióxido de carbono (CO₂) na atmosfera. Hoje, a Terra está coberta por evidências da presença humana — cidades, fábricas, estradas e microplásticos nos oceanos — e o aumento nas emissões de CO₂ ameaça desequilibrar completamente o sistema climático global.

Antes da Revolução Industrial, a concentração de CO₂ na atmosfera era de aproximadamente 280 ppm (partes por milhão). Em 2016, esse número ultrapassou os 400 ppm pela primeira vez em 4 milhões de anos. Estudos indicam que, durante o Plioceno, período geológico com níveis semelhantes de CO₂, as temperaturas eram entre 2ºC e 3ºC mais altas, as camadas de gelo na Antártida estavam derretendo e o nível do mar era entre 6 e 20 metros mais elevado do que hoje.

A rápida industrialização e o crescimento econômico, impulsionados pelo capitalismo, transformaram o planeta em uma era de constante degradação ambiental. A busca incessante por lucro e expansão a qualquer custo tornou-se incompatível com os limites finitos da Terra.

A relação entre capitalismo e crise climática

A raiz da crise climática está profundamente conectada ao sistema capitalista. Desde a Revolução Industrial, a lógica do lucro e do crescimento econômico impulsionou o uso desenfreado de recursos naturais. A produção em massa e o consumo excessivo, pilares do capitalismo global, geraram uma demanda insustentável por combustíveis fósseis, acelerando as emissões de gases de efeito estufa e degradando ecossistemas inteiros.

O sistema capitalista, ao promover o crescimento econômico como solução para todos os problemas sociais, falhou em reconhecer que esse crescimento tem limites ecológicos. A devastação ambiental não é um “efeito colateral” do progresso, mas sim uma consequência inevitável de um modelo econômico baseado na exploração sem fim. Para conter o aquecimento global e evitar o colapso climático, é preciso enfrentar o próprio capitalismo e seus excessos.

A elite e o “Grande Reinício”

Nos últimos anos, conceitos como o “Grande Reinício”, proposto no Fórum Econômico Mundial em Davos, têm ganhado força. A ideia de uma reformulação global do capitalismo, com foco em sustentabilidade e justiça social, parece uma solução promissora. No entanto, há razões para acreditar que essas propostas não são tão transformadoras quanto parecem. As elites econômicas e políticas que controlam grande parte das decisões globais têm um histórico de manter seus privilégios à custa do bem-estar coletivo.

Mesmo que as mudanças climáticas avancem, as camadas ultrarricas podem continuar a desfrutar de uma vida de conforto e segurança. Para a maioria da população, no entanto, as consequências serão devastadoras: aumento da desigualdade, migração forçada, insegurança alimentar e crises de saúde pública. A pandemia de COVID-19 já revelou como as crises globais afetam desproporcionalmente os mais vulneráveis, e o mesmo pode ser dito sobre a crise climática.

Decrescimento: a alternativa necessária

Se o capitalismo é o principal culpado pela crise climática, qual seria a solução? Uma corrente crescente de pensadores e ativistas defende o decrescimento econômico como uma alternativa viável. O decrescimento propõe uma economia que não seja baseada na expansão incessante, mas sim na redistribuição justa da riqueza e na preservação dos recursos naturais.

Nesse modelo, a produção social e o bem-estar coletivo substituem o lucro como objetivos centrais. O decrescimento sugere uma ruptura com os paradigmas econômicos atuais, propondo um sistema que respeite os limites planetários e busque uma relação harmoniosa entre humanos e natureza. Ao contrário do crescimento contínuo, o decrescimento exige uma mudança profunda nos valores sociais e nas práticas econômicas, priorizando a equidade e a sustentabilidade.

O papel de cada cidadão

Embora as mudanças sistêmicas sejam fundamentais, não podemos esperar que elas sejam implementadas por elites ou governos. Cada cidadão tem um papel crucial na luta contra o aquecimento global. No entanto, é importante reconhecer que ações individuais, por mais simbólicas que sejam, não são suficientes. Precisamos pressionar por políticas públicas robustas, como a transição para energias renováveis, a proteção de florestas e ecossistemas e a regulação estrita das emissões industriais.

A crise climática é um problema coletivo, que exige uma resposta coordenada entre governos, corporações e cidadãos. Para salvar o futuro do planeta, é necessário enfrentar a realidade do sistema que gerou essa crise. Só então poderemos construir um novo modelo de prosperidade, baseado na justiça social e ambiental.

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Bacharel em geografia pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU); jornalista profissional desde 1987, web design há mais de 20 anos. gestor social, líder comunitário, ecologista. Frank é pesquisador na área de planejamento urbano, mobilidade sustentável e geomarketing.