Brasília, 31 de março de 2025 — Um evento no Senado Federal nesta segunda-feira (31) reuniu historiadores, pesquisadores e parlamentares para o lançamento do livro “1964 – Imagens de um Golpe de Estado”, obra que reúne registros visuais raros e pouco conhecidos do movimento que instaurou a ditadura militar no Brasil. A data simboliza os 61 anos da partida das tropas do general Olympio Mourão Filho de Juiz de Fora (MG) rumo ao Rio de Janeiro, em 31 de março de 1964, episódio que deflagrou um regime autoritário de 21 anos. Além da nova publicação, o evento promoveu a reedição de dois clássicos sobre o período: *”Golpe de 64 Visto e Comentado pela Casa Branca”, do jornalista Marcos Sá Correa, e “Anatomia da Crise”, do cientista político Wanderley Guilherme dos Santos (1935-2019).
Organizado pelos historiadores Heloisa Starling e Danilo Marques e pela pesquisadora Livia de Sá Baião, “1964 – Imagens de um Golpe de Estado” oferece um mosaico visual que vai além de fotografias. As 71 imagens selecionadas incluem manchetes de jornais, cartazes de propaganda, documentos oficiais, flâmulas e ilustrações, cobrindo o período de novembro de 1963 — quando a crise política se intensificou — até 15 de abril de 1964, data da posse do general Castello Branco.
Imagens que Desvelam a Trama Golpista
A capa do livro traz uma foto emblemática de Rubens Américo, da extinta revista O Cruzeiro: um soldado agride um homem caído no chão durante protesto em Recife, em 1º de abril de 1964. A cena, pouco difundida, contrasta com a ausência de trabalhos consagrados, como os do fotógrafo Evandro Teixeira. “Buscamos uma visão ampla e diversa, com registros de todas as regiões do país”, explica Danilo Marques.
Entre as raridades está uma foto de Jean Solari (também de O Cruzeiro) que mostra o governador de Minas Gerais, Magalhães Pinto, cumprimentando o presidente da Câmara, Ranieri Mazzilli, durante a posse de Castello Branco. “Essa imagem simboliza o selo da conspiração. Magalhães Pinto foi um dos articuladores do golpe, e a cena revela a transição orquestrada”, destaca Marques.
A obra também expõe estratégias dos conspiradores, como uma ilustração do manual “Sua Parte na Luta contra o Comunismo”, produzido pelo Ipes (Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais), entidade que mobilizou empresários contra o governo de João Goulart. Cada imagem é acompanhada de análises de pesquisadores do Projeto República da UFMG, coordenado por Heloisa Starling, contextualizando os registros e oferecer novas interpretações.
Reedições recuperam análises fundadoras
Além do livro de imagens, o evento relançou duas obras fundamentais. “Golpe de 64 Visto e Comentado pela Casa Branca”, de Marcos Sá Correa, revela documentos estadunidenses que comprovam o apoio internacional ao regime, enquanto *”Anatomia da Crise”*, de Wanderley Guilherme dos Santos, analisa as fragilidades institucionais que permitiram a ruptura democrática.
“Essas reedições são um antídoto contra o esquecimento. Em tempos de revisionismos, é crucial confrontar a história com fatos”, afirmou um dos organizadores do evento, em referência aos debates recentes sobre a ditadura no Brasil.
Memória e atualidade
O lançamento no Senado, casa que já abrigou figuras ambíguas em relação ao período militar, ganha relevância em um contexto de polarização política. Para Heloisa Starling, “revisitar essas imagens é entender como o passado ressoa no presente”. A pesquisadora enfatiza que a obra não se limita a denunciar a violência, mas expõe a construção gradual do golpe, desde a propaganda anticomunista até a tomada do poder.
A escolha pelo recorte regional diversificado — incluindo cenas do Nordeste, Sul e Centro-Oeste — busca desfazer a noção de que o golpe foi um evento restrito ao eixo Rio-São Paulo. Fotografias de prisões no Recife, comícios no Rio Grande do Sul e panfletos em Goiânia ilustram como a instabilidade foi fabricada nacionalmente.
Por que relembrar 1964 em 2024?
Seis décadas depois, o Brasil ainda enfrenta tensões entre democracia e autoritarismo. Para os organizadores, a publicação serve tanto como instrumento educativo quanto como alerta. “As imagens mostram que o golpe não foi um raio em céu azul. Foi um processo alimentado por setores civis, militares e midiáticos”, ressalta Danilo Marques.
O evento no Senado, ao reunir academia e política, sugere um esforço para preservar a memória em um momento em que discursos negacionistas ganham espaço. Como escrevem os autores na apresentação do livro: “Mostrar essas imagens é reconfigurar nossa percepção do passado — e, com isso, interrogar o presente”.
Enquanto o país debate o legado da ditadura, obras como essas reforçam que, sem compreender as rupturas de 1964, é impossível construir um futuro à altura dos ideais democráticos.
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